Poema: Viriato da Cruz (adaptado) [texto original >> abaixo]
Música e arranjo: Fausto Bordalo Dias
Intérprete: Sérgio Godinho* (in LP "De Pequenino se Torce o Destino", Guilda da Música/Sassetti, 1976, reed. Polygram, 1990, Universal, 2001)
[instrumental]
Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
e com letra bonita eu disse, ela tinha
um sorriso luminoso tão triste e gaiato
como o sol de Novembro brincando de artista
nas acácias floridas, na fímbria do mar.
[instrumental]
Sua pele macia – era sumaúma...
sua pele macia, cheirando a rosas
seus seios laranja – laranja do Loge.
Eu mandei-lhe essa carta
e ela disse que não.
[instrumental]
Mandei-lhe um cartão
que o amigo Maninho tipografou:
«Por ti sofre o meu coração»
Num canto – SIM, noutro canto – NÃO
E ela o canto do NÃO dobrou.
[instrumental]
Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete
pedindo e rogando de joelhos no chão
pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigénia
me desse a ventura do seu namoro...
E ela disse que não.
[instrumental]
Mandei à avó Chica, quimbanda de fama,
a areia da marca que o seu pé deixou
para que fizesse um feitiço bem forte e seguro
e dele nascesse um amor como o meu...
E o feitiço falhou.
[instrumental]
Andei barbado, sujo e descalço
como um mona-ngamba.
Procuraram por mim
«– Não viu... (ai, não viu...?) não viu Benjamim?»
E perdido me deram no morro da Samba.
[instrumental]
Para me distrair
levaram-me ao baile do senhor Januário,
mas ela lá estava num canto a rir,
contando o meu caso
às moças mais lindas do Bairro Operário.
[instrumental]
Tocaram a rumba e dancei com ela
e num passo maluco voámos na sala
qual uma estrela riscando o céu!
E a malta gritou: "Aí, Benjamim!"
Olhei-a nos olhos – sorriu para mim
pedi-lhe um beijo (ra ra ra ra ai... ra ra ra ra ai)
e ela disse que sim. [3x]
* Sérgio Godinho – voz e metalofone
Fausto Bordalo Dias – viola
Paulo Godinho – viola baixo
Direcção musical – Sérgio Godinho e Fausto Bordalo Dias
Gravado nos Estúdios Rádio Triunfo, Lisboa, em Janeiro de 1976
Engenheiro de som – José Manuel Fortes
NAMORO
(Viriato da Cruz, in "Poemas", Lisboa: Casa dos Estudantes do Império, 1961; "No Reino de Caliban II", org. Manuel Ferreira, Lisboa: Seara Nova, 1975, reed. Lisboa: Plátano, 1988; "50 Poetas Africanos: Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe", org. Manuel Ferreira, Lisboa: Plátano, 1989)
Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
e com letra bonita eu disse ela tinha
um sorrir luminoso tão quente e gaiato
como o sol de Novembro brincando de artista nas acácias floridas
espalhando diamantes na fímbria do mar
e dando calor ao sumo das mangas
Sua pele macia — era sumaúma...
Sua pele macia, da cor do jambo, cheirando a rosas
sua pele macia guardava as doçuras do corpo rijo
tão rijo e tão doce — como o maboque...
Seus seios, laranjas — laranjas do Loge
seus dentes... — marfim
Mandei-lhe essa carta
e ela disse que não.
Mandei-lhe um cartão
que o amigo Maninho tipografou:
«Por ti sofre o meu coração»
Num canto — SIM, noutro canto — NÃO
E ela o canto do NÃO dobrou.
Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete
pedindo rogando de joelhos no chão
pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigénia,
me desse a ventura do seu namoro...
E ela disse que não.
Levei à avó Chica, quimbanda de fama
a areia da marca que o seu pé deixou
para que fizesse um feitiço forte e seguro
que nela nascesse um amor como o meu...
E o feitiço falhou.
Esperei-a de tarde, à porta da fábrica,
ofertei-lhe um colar e um anel e um broche,
paguei-lhe doces na calçada da Missão,
ficámos num banco do largo da Estátua,
afaguei-lhe as mãos...
falei-lhe de amor... e ela disse que não.
Andei barbado, sujo e descalço,
como um mona-ngamba.
Procuraram por mim
«— Não viu... (ai, não viu...?) não viu Benjamim?»
E perdido me deram no morro da Samba.
Para me distrair
levaram-me ao baile do sô Januário
mas ela lá estava num canto a rir
contando o meu caso às moças mais lindas do Bairro Operário.
Tocaram uma rumba — dancei com ela
e num passo maluco voámos na sala
qual uma estrela riscando o céu!
E a malta gritou: «Aí, Benjamim!»
Olhei-a nos olhos — sorriu para mim
pedi-lhe um beijo — e ela disse que sim.